01/03/2007

25 DE ABRIL (I)

O 25 de Abril de 1974, foi o dia, que o calendário da história contemporânea, elegeu como o dia da Liberdade. Um dia inesquecível!!!
De madrugada, por volta das 2 horas, o Rádio Clube Português, colocou no ar, na sua programação normal, as músicas – E depois do Adeus – cantada por Paulo de Carvalho, e – Grândola Vila Morena – cantada por Zeca Afonso, músicas intencionalmente escolhidas para serviram de senha e contra senha, abrindo caminho e dando vida, aquele que foi o maior acontecimento político da história de Portugal - a Revolução do 25 de Abril!!!
Era quinta-feira e já o sol radioso brilhava vindo de terra dentro, quando o País acordou para o trabalho, ao som de marchas militares, mas aturdido pela notícia de que um movimento militar acabara de marchar sobre Lisboa, para tomar o poder. A cidade de Viana, não foi excepção.
As notícias difundidas através das rádios e R T P, corriam em catadupa, e toda a gente se interrogava: - uns dando mostras de grande regozijo e extravasando de alegria, outros, ainda incrédulos, pensavam, que o que estava a acontecer era irreal, e portanto tudo não passava de um sonho.
Mas de facto, tudo o que se ia ouvindo pelos órgãos de comunicação social, era bem real e verdadeiro. O movimento de militares designado por M F A – Movimento das Forças Armadas, constituído por Oficiais, Sargentos e Praças dos três ramos, depois da ordem dada pelas canções que para todo o sempre vão imortalizar o acontecimento, tomaram os seus postos, levando por diante, com bravura, disciplina e muito risco, aquela que para sempre, ficou conhecida como a “Revolução dos Cravos”.
Quem esteve atento ao desenrolar dos acontecimentos, facilmente se foi apercebendo, de que o objectivo nobre da revolta, comandada por um punhado de valorosos Capitães, era depor o poder ditatorial, instituído há mais de 4 décadas pelo Estado Novo, e restituir, ao Povo, após um período de transição, um conjunto de direitos, liberdades e garantias, a consignar através de eleições constituintes e legislativas, livres e democráticas.
Já a manhã ia longa, e as notícias emitidas pelas rádios nacionais, nomeadamente a Emissora Nacional, a Rádio Renascença e a que se tornou oficial e a mais ouvida durante todo o processo revolucionário - O Rádio Clube Português - e também pelo único canal de televisão existente, a R T P, eram ouvidas e vistas com tanto interesse e sagacidade, que quase não havia tempo para comentários. Vivia-se um sonho que parecia não ter fim!!!
Nas ruas, nos cafés e nos restaurantes, as pessoas não tiravam os ouvidos dos transístores e os olhos dos televisores, tal era a ansiedade em saber tudo o que se passava ao mais ínfimo pormenor. Corriam notícias, que em Lisboa, teatro das mais importantes operações, já no inicio da manhã, haviam sido tomados pelo M F A – Movimento das Forças Armadas - entre outros de menor importância, os Ministérios da Guerra e do Interior, a sede da Polícia Política (D G S) e seus apêndices, para além de controlo de fronteiras aéreas, marítimas e terrestres e outros pontos considerados de interesse estratégico e operacional, designadamente os meios de comunicação social com destaque para a R T P.
Também se fazia eco, de que a adesão de todas as unidades militares espalhadas por todo o território do continente e ilhas adjacentes dos Açores e Madeira, incluindo as unidades sediadas nas denominadas províncias ultramarinas, foi maciça, submetendo-se sem quaisquer condições ao poder da Unidade de Comando instalada na Cova da Moura, nos arredores de Lisboa.
Aos comandos dessas unidades, foi expressamente ordenado pelo Comandante Operacional, o Capitão Otelo Saraiva de Carvalho, que se deveriam manter nos respectivos quartéis, em prontidão e alerta máximos, com disponibilidade total para acorrer a qualquer incidente, garantindo, nomeadamente, a segurança de pessoas e bens, vulneráveis a todo tipo de sabotagens, por parte de eventuais caciques e seus espúrios, existentes nas respectivas áreas de intervenção.
A par da tomada de todo o aparelho do Estado, também Marcelo Caetano, Presidente do Conselho, foi detido logo pela manhã na sua residência particular do Restelo, e posteriormente levado para as instalações do Quartel do Carmo, aguardando aí, em absoluta segurança o veredicto dos revoltosos, quanto ao seu destino.
Já a noite se aproximava e as notícias eram cada vez mais entusiasmastes. A R T P, mostrava em directo, aquele que foi o episódio, talvez mais marcante do dia, e quiçá, de toda a história da Revolução.
As imagens, seguidas em todo o País com grande expectativa e alguma angústia, mostravam, nas imediações do Largo fronteiriço ao Quartel do Carmo, o movimento de uma Chaimite, que se deslocava lentamente por entre a multidão, comandada por um dos valorosos capitães de Abril, o saudoso Capitão Salgueiro Maia, do Regimento de Cavalaria de Santarém.
Ouvia-se na reportagem, que a missão, tinha como objectivo, resgatar em absoluta segurança, do interior do Quartel do Carmo, o deposto Presidente do Conselho e conduzi-lo ao aeroporto da Portela, onde o aguardava um avião, que dali o havia de levar até à Ilha da Madeira e mais tarde, ao exílio no Brasil, onde anos depois viria a falecer.
A operação de resgate, apesar de alguma tensão, muito manifesta nalgumas franjas da imensa multidão que enchia por completo o Largo do Carmo, decorreu com absoluta normalidade. Os milhares de pessoas, empoleiradas em árvores, candeeiros, varandas e até em cima dos automóveis que ali se encontravam estacionados, quando a Chaimite se retirava rumo ao aeroporto, em vez de mostrar ódio gratuito ou proferir palavras de menos respeito para com o prisioneiro, antes entoaram cânticos de “Grândola Vila Morena” e gritou, a plenos pulmões, palavras de ordem, tais como: - “25 de Abril Sempre”, “Fascismo Nunca Mais”, para terminarem em uníssono, “O Povo unido nunca mais será vencido”.
Já a noite tinha caído, quando o País inteiro fazia o primeiro balanço do mais feliz de todos os pesadelos.
Por volta das 20 horas, o General Spínola, chefe da Junta de Salvação Nacional, desde logo constituída, leu em directo, dos estúdios da R T P, no Lumiar, o primeiro comunicado, em nome do M F A.
Nesse comunicado, deu conta, a todos os Portugueses, do êxito que foi a operação desencadeada pelas Forças Armadas, destacando, que a tomada do poder, aconteceu, sem necessidade de uso de meios violentos, ou derramamento de sangue, só possível, devido à grande serenidade e espírito de maturidade cívica demonstrados pelas populações, que desde o primeiro momento acarinharam nas ruas, nas repartições públicas, nas fábricas e outros locais, o Movimento Militar, encetado no início da madrugada, manifestando a sua alegria, com a entrega de cravos vermelhos aos soldados, que os colocaram nos canos das espingardas, gesto que simbolizará para sempre a gratidão das populações para com os abnegados Militares.
Aquele Oficial General, depois de apelar aos cidadãos para que se mantivessem nas suas residências ou nos seus locais de trabalho, em absoluta tranquilidade mas vigilantes, advertiu, com a autoridade conferida e legitimada pelo Movimento Militar, que qualquer tentativa contra-revolucionária, seria severamente punida.
Ao Corpo Diplomático acreditado em Portugal, transmitiu também, em nome da Junta de Salvação Nacional e em nome do Povo Português, o firme propósito de honrar todos os compromissos e tratados, assumidos pelo regime deposto.
A partir deste momento, o País ficou mais sereno e toda a gente rejubilava com o acontecimento e com muita esperança no futuro.
Já a noite ia longa, quando a maioria dos cidadãos recolheu a suas casas., cansados por um dia de acontecimentos tão intensos, mas naturalmente muito felizes e com manifesta ansiedade do dia seguinte, para começar a trabalhar para um Portugal livre, democrático e mais solidário.
Por mim, que também vivi o dia intensamente, fiquei ainda pelas ruas a deambular, como que, a saboreando mais um pouco tanta emoção, tanta felicidade! Mais tarde, com alguns amigos, fomos ao Viana Mar, comer francesinhas e beber cerveja, aproveitando o momento para discutir, em absoluta liberdade, que benefício para os cidadãos traria no futuro, esta Revolução, que o poeta imortalizou no seu poema: - “As Portas que Abril Abriu”.
Já de madrugada, após um dia “inesquecível”, adormeci, com um único pensamento, que ainda hoje guardo com imensa saudade: - “25 de Abril Sempre”!!!

Octávio Pires

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